Nas últimas semanas têm sido divulgados uma série de escândalos envolvendo grandes empresas do agronegócio em relação ao uso de trabalho análogo à escravidão. Fornecedora de mão-de-obra das vinícolas Salton, Garibaldi e Aurora tiveram 207 trabalhadores resgatados nessas condições. Alguns dias depois, 32 homens também foram resgatados de uma fazenda fornecedora de cana-de-açúcar à Caravelas. E mais de 80 outros trabalhadores foram também resgatados de duas fazendas de arroz arrendadas pela estância São Joaquim.
Vale ressaltar que essa situação, infelizmente, não é exclusividade do agronegócio. É frequente a divulgação de casos semelhantes em outros setores de negócios, como da moda e da construção civil.
Esses escândalos demonstram o quanto ainda estamos longe da adoção real e efetiva da pauta o ESG, especialmente no que se refere às questões sociais e, principalmente, de governança corporativa.
Além de envolver a prática de um crime, o uso de trabalho análogo à escravidão representa uma afronta ao “S” do ESG, que parte do princípio de que as organizações precisam cuidar dos impactos que causam nas pessoas com quem se relacionam, inclusive seus colaboradores contratados direta ou indiretamente, não apenas porque é o certo a ser feito, mas porque pode gerar ganhos de produtividade e reputação.
E como evitar situações como estas? Com certeza não é fazendo declarações vazias de que atende a pauta ESG, mas, antes de mais nada, adotando boas práticas de governança corporativa, que envolve, entre outras coisas, a implementação de uma gestão de riscos de conformidade (Programa de Compliance), inclusive relacionado aos seus fornecedores e de toda a sua cadeia produtiva.
Uma das ações práticas que devem ser utilizadas por qualquer organização que possua fornecedores (ou seja, praticamente todas), é o due diligence, que implica na adoção de uma série de cuidados no momento da contratação do fornecedor, buscando identificar que atende não só a legislação, mas os mesmos valores da organização contratante, além do monitoramento da sua atuação ao longo das atividades por ele desenvolvidas. Depois do escândalo, não adianta falar que “não sabia”.
Estas são medidas que visam proteger não só as partes interessadas, mas as próprias organizações.
Tomamos como exemplo o caso das empresas Salton, Garibaldi e Aurora. Já foi anunciado que terão de pagar o equivalente a 7 milhões de reais em indenizações, além de terem de adotar medidas para fortalecerem a fiscalização de seus prestadores de serviços (as mesmas que mencionamos acima e que já deveriam ter sido adotadas antes do ocorrido), sem falar no prejuízo reputacional, impossível de ser estimado.
A opinião pública e os consumidores de uma forma geral estão cada vez mais exigindo que as empresas se responsabilizem por suas atividades.
Nada contra a busca de melhores resultados, mas não é mais aceitável se obter o lucro a qualquer custo. Ele deve ser obtido de forma legítima e ética, respeitando o princípio básico da governança corporativa da responsabilidade corporativa. Focar no ESG e na Conformidade (Compliance) implica em seguir exatamente esse princípio.
As empresas devem ser responsáveis por suas ações. Depois não adianta pedir desculpas. O dano, não só a terceiros, mas à própria empresa já ocorreu e a recuperação, principalmente da sua reputação, é muito mais custosa que a prevenção.
Monica Bressan
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