O termo Compliance tem ganhado espaço nas discussões corporativas, mas ainda é frequentemente mal interpretado. Um dos erros mais comuns é tratá-lo como sinônimo de “jurídico preventivo” — uma visão limitada que reduz sua potência estratégica e compromete sua aplicação transversal em relação às diferentes áreas da gestão de uma organização.
O reducionismo jurídico
Embora o Compliance envolva conformidade com leis e regulamentos, restringi-lo ao escopo jurídico é ignorar sua natureza sistêmica e multidisciplinar. Ele não pertence exclusivamente ao departamento jurídico — pertence à cultura organizacional e à estratégia empresarial.
Compliance não é apenas sobre evitar sanções. É sobre estruturar decisões éticas, fortalecer controles internos e promover uma cultura de integridade que permeia toda a organização.
O que o Compliance realmente envolve
- Gestão de riscos sistematizada: identificação, avaliação e mitigação de riscos operacionais, reputacionais, financeiros, ambientais e sociais.
- Controles internos eficazes: políticas e procedimentos que garantem integridade, rastreabilidade e prevenção de desvios.
- Alinhamento de processos: integração entre áreas para assegurar coerência entre estratégia, operação e cultura.
- Transformação da gestão: exige líderes que promovam uma cultura ética e estejam comprometidos com a responsabilidade corporativa.
ISO 37301: o padrão internacional que consolida essa visão
A ISO 37301, publicada em 2021, é a norma de padronização internacional que estabelece requisitos para um Sistema de Gestão de Compliance. Ela reconhece o Compliance como um componente essencial da governança corporativa, e não apenas como uma função jurídica.
A norma propõe uma abordagem baseada em riscos legais e de não cumprimento de normas internas, alinhada à estratégia da organização, e exige o envolvimento da alta liderança. Ela reforça que o Compliance deve ser:
- Integrado aos processos de negócio
- Sustentado por uma cultura organizacional ética
- Monitorado e continuamente aprimorado
A ISO 37301 é, portanto, um marco que ajuda a consolidar o Compliance como prática de gestão estratégica, e não como simples adequação legal.
Compliance como pilar da governança corporativa
Governança corporativa, segundo a edição mais recente do Código de Melhores Práticas do IBGC, se fundamenta em cinco princípios: integridade, transparência, equidade, responsabilização e sustentabilidade. O Compliance atua diretamente em todos eles:
- Integridade: ao promover condutas éticas e prevenir desvios, o Compliance reforça a integridade como valor organizacional.
- Transparência: ao estabelecer controles e processos claros, garante que as informações fluam de forma íntegra e acessível.
- Equidade: promove tratamento justo entre stakeholders, evitando favorecimentos e conflitos de interesse.
- Responsabilização: cria mecanismos para que líderes e colaboradores respondam por suas decisões e condutas.
- Sustentabilidade: assegura que a empresa opere com ética, respeitando não apenas as leis, mas também os valores sociais, ambientais e de longo prazo.
Mais do que evitar riscos, o Compliance cria valor. Ele fortalece a reputação, atrai investidores, melhora o ambiente interno e prepara a empresa para crescer de forma sustentável.
Conclusão
A verdadeira força do Compliance está em sua capacidade de gerir riscos da organização e transformar a cultura organizacional, integrar áreas, sustentar decisões éticas e consolidar a governança corporativa como prática viva e cotidiana.
A ISO 37301 nos convida a enxergar o Compliance como ele realmente é: um sistema de gestão que fortalece a governança, a ética e a sustentabilidade empresarial.
Se queremos empresas mais resilientes e preparadas para o futuro, precisamos parar de tratar o Compliance como um departamento — e começar a tratá-lo como um princípio de liderança e gestão estratégica.